sábado, 30 de abril de 2022

BALADA PARA JOSÉ SIQUEIRA

por: Lau Siqueira



Sempre acredito na força do acaso. Algumas coisas acontecem numa sequência espetacular. Se as coincidências existem ou são fruto de um roteiro misterioso escrito previamente, não sei. O fato é que quase sempre existe muita estranheza em algumas casualidades. Não sou absolutamente uma pessoa religiosa. Costumo me definir como “ateu ecumênico”. Sequer há originalidade alguma nisso. Na verdade, foi o que ouvi da boca do jornalista e biógrafo Fernando Morais e adotei.

Em 2019 eu trabalhava num programa social de música e estávamos na Serra do Açu, em Catolé do Rocha, gravando uma cena para um documentário sobre a vida do Maestro José Siqueira. Foi ele o criador da Ordem dos Músicos do Brasil. Fundou orquestras importantes como a Orquestra Sinfônica Brasileira, Orquestra do MEC, Orquestra Sinfônica de Recife e muitas outras. Possui uma obra tão vasta e encantadora quanto Heitor Villa Lobos, mas era comunista e foi silenciado pela ditadura.

Entre setembro de 2013 e dezembro de 2014, presidi a maior fundação cultural da Paraíba. A FUNESC - Fundação Espaço Cultural. Uma instituição que administra todos os teatros estaduais e o maior centro cultural do Brasil - o Espaço Cultural José Lins do Rego. Um baita equipamento que abriga teatros, cinema, gibiteca, planetário, escola de música, escola de dança, museu, galeria, uma biblioteca com mais de 100 mil títulos, um dos maiores acervos expressionistas do mundo, o Memorial Abelardo da Hora, etc.

Todavia faltava uma sala de concertos e o governador Ricardo Coutinho decidiu que a reforma incluiria esse presente ao povo paraibano. A Orquestra Sinfônica da Paraíba - OSPB já foi considerada uma das melhores do país. Quando cheguei na Fundação o nome que estava previsto para a sala era do grande Maestro Eliazar de Carvalho que havia sido regente da OSPB nos anos 80. O Maestro Eliazar é um dos grandes nomes da música erudita em nosso país em todos os tempos. Disso ninguém duvida.

Sempre fui incomodado com o débito que a Paraíba tinha com o grande maestro sertanejo. Um homem que com 14 anos já regia a Orquestra Filarmônica de Bonito de Santa Fé, no Sertão. Alguém que sonhava em ver os jovens do seu estado tocando suas músicas. Então parti para uma consulta junto aos músicos. Visitei alguns professores do Curso de Música da Universidade Federal da Paraíba. O nome do Maestro foi unanimidade e a sala de Concertos ganhou o nome do grande José Siqueira.

Gravando para o documentário em Catolé do Rocha, já distante da Fundação, as fichas começaram a cair. Descobri que José Siqueira tinha falecido em 22 de abril de 1985. Exatamente no dia em que cheguei a Paraíba. A morte do maestro foi ofuscada por uma grande comoção nacional. Naquele dia, era anunciada também a morte do presidente Tancredo Neves. Percebi então que estava fechando um ciclo na gravação de uma cena com uma orquestra jovem executando uma música do maestro em pleno Sertão.

Apesar da coincidência no sobrenome, não existe qualquer parentesco comigo. Nasci na fronteira com o Uruguai e ele no Alto Sertão da Paraíba. Este gênio brasileiro compôs peças monumentais, como “Xangô - cantata negra”; “Quinta Sinfonia - indígena”; a ópera “A compadecida”. “Toada para José Siqueira” é um documentário de Eduardo Consonni, Rodrigo T. Marques, descendentes do Maestro. Admirado na Europa, José Siqueira ainda carece de pleno reconhecimento no Brasil.



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