quinta-feira, 22 de setembro de 2022

FOTOGRAFIAS e FOTÓGRAFOS - Tópicos para um possível estudo em Cajazeiras.

por: Cleudimar Ferreira


José Cavalcante (no meio), um pioneiro desde o tempo dos lambe-lambes

 

O ato de fotografar talvez não seja compreendido com o fazer artístico, mas a forma como se busca uma imagem e der a ela uma importância maior além do que ela já tem para o fotógrafo, pode sim ser considerado um procedimento de busca de uma estética diferente e aí, pode ser definido como arte. Se buscarmos na história, a sua importância para concepção de outras linguagens da arte, veremos que a fotografia contribui e muito para desenvolvimento das artes visuais, não só as artes plásticas, mas principalmente o cinema que é considerado uma espécie de cria da fotografia.

Vem desse pressuposto, o entendimento da discursão que há, quando se pergunta: A fotografia é arte ou não?  Uma resposta que não pode ser dada unicamente por quem a pesquisa ou estuda sua história, mas o fotógrafo como parte desse contexto, merece e pode muito bem responder a tal pergunta e, como propor meios para referendar certos conceitos, que define que o ato de fotografar é um ato de criação e, se é um ato de criação, vem inserido também o direito de ser a fotografia um instante de criação artístico.

Para justificar esse debate, o trabalho do fotógrafo nessa circunstancia é captar a imagem, buscando a melhor qualidade visual e estética possível. Embora seja o momento de fotografar, uma minúscula busca de um recorte do vasto cenário desse mundo em que vivemos, o cuidado na ora de captar uma imagem é que vai resultar se essa imagem gravada é uma obra de arte ou não. 

Há muito tempo que a história da fotografia em Cajazeiras, vinha sendo uma atividade remota, difícil de ser revelada. Tudo não passava de um capítulo a ser contado ou complexo demais para ser revelado. Perecia na escuridão dos arquivos mofados, por falta de voluntários ou pessoas que apresentasse algum interesse pelo seu passado, pelo o seu estudo. Mas eis que nesse marasmo de falta de dados, apareceu alguém interessado de conhecer a sua história.    

O trabalho do fotógrafo José Cavalcante, que nos últimos anos passou a desenvolver junto com a sua atividade profissional, uma incessante busca e procura de maiores referências dos pioneiros dessa atividade na cidade, merece apoio, destaque por muitos e, ser referenciada por todos cajazeirenses. Por esse viés, se qualquer um que for remexer os anais; os arquivos da história dessa atividade na cidade, facilmente logo descobria que teria muito trabalho pela frente, pois a cidade tem tradição e teve muitos profissionais atuando nesse campo.

Entre estúdios montados, equipados com laboratórios e as atividades de freelances ou aqueles que trabalharam nas ruas, fazendo-se de amador ou aprendiz, a fotografia em Cajazeiras desde as primeiras ações isolados do fotógrafo José Magalhães nos anos vinte, já ultrapassou os cem anos e chegou à modernidade dos Smartphones registrando o perfil do povo cajazeirense.

Até aqui, revelou durantes muitos anos, profissionais pioneiros, que a priori, com suas sedutoras e versáteis Rolleiflex, deixaram um vasto acervo documental da vida social, politica da cidade. Basta ver a quantidade de fotos antigas que tem sido divulgada nas redes sociais até aqui. Entre esses tantos, outros e os lambe-lambes do senhor José Cavalcante (pai), destacaram ainda no século passado os nomes dos estabelecidos: Seu Iraídes do Foto Recife; Elias Paulo do Foto Rápido, Nelson Lira, proprietário do Estúdio Lira de Fotografias e Cícero Batista que chegou a ter um dos bem equipados laboratório em preto e branco do sertão de Cajazeiras.   

O Estúdio Lira era especialista em fotografias de noivos. Atuava nas solenidades de casamentos e quando não esta in loco, geralmente os noivos iam até o seu estúdio. “Como foi o caso da minha tia Naninha Ferreira, que no dia do seu casamento, no final dos anos sessenta, quis ser fotografada na igreja, mas preferiu também ir instantes depois do casamento ao Estúdio Lira para ser fotografada com o esposo Paulo Saraiva e a dama de honra”. Lira e seu estúdio chegou a situar nos anos 60, em uma sala comercial que ficava na Rua Padre José Tomás, entre as esquinas das antigas Casas Pernambucanas e o Armazém Nova Aurora de seu Zuza Moreira.

Outro destaque no contexto para o estudo da fotografia em Cajazeiras foi à atuação do senhor Cícero Batista. Estabelecido no ramo com a fachada Foto Recife, que ficava na Rua Padre José Tomaz, perto da esquina da Rua Padre Rolim, Cícero além da loja, possuía um estúdio bem equipado que garantia nitidez e bom contraste das fotos que produzia, oferecendo aos seus clientes fotos de qualidade e durabilidade das revelações. Seu filho Manoel Arsênio Batista, reservava com Cícero os trabalhos tanto no laboratório, como o atendimento no balcão do Foto Recife e até a atividade de fotografo, quando tinha que substituir numa cobertura fotográfica a pedido de um cliente.

Usando os recursos do laboratório do pai Cícero Batista, Arsênio brincava com a imagem, fazendo fotomontagem, usando a fotografia como expressão artística e não simplesmente uma imagem, se tornando uma dos pioneiros da fotomontagem em Cajazeiras. Como admirador da sétima arte, costumava brincar com os fotogramas descartados das revisões dos filmes que eram exibidos nos cinemas de Cajazeiras, transformando as pequenas imagens desses, em fotografias ou retratos em preto e branco. Ou seja, para o seu bel prazer transformava a ilusão do cinema em uma imagem fixa no papel.

Por esse caminho, voltando pelas vias do passado, numa época remota quando a demanda maior da atividade fotográfica ainda concentrava-se nas mãos dos homens, Cajazeiras dava um salto maior, mostrando ser cosmopolita avançado no tempo, apresentado para a sociedade o nome de Chiquitinha Elias, talvez a primeira mulher na cidade a se aventurar na atividade fotográfica em Cajazeiras. Sempre nos grandes eventos, sejam eles, festas de debutantes, colação de grau, batizados e casamentos, Chiquitinha sempre se fazia presente, com sua simpatia, profissionalismo e seriedade no trabalho que fazia. Lembro muito bem da sua imagem nas festas e sou testemunha do seu profissionalismo a presteza como conduzia o seu trabalho.          

Numa cidade onde nos ano oitenta, a ascensão da imprensa escrita se mostrava crescente com as instalações das sucursais dos jornais impressos da capital, a atividade de fotógrafo ganhava mais uma opção de trabalho, com possibilidades de qualificação da mão de obra e de formação de outra especialidade - a do fotojornalismo. Conceito em que a matéria escrita é atrelada a uma apresentação de fotos ou que a produção de uma narrativa em imagens, poderia ser por vias de conjugação de fotografias e textos, és que surge a figura eminente e simpática do fotografo Bosco Pinto. Bosco era aquele que circulavam pelos clichês dessas sucursais fazendo o que ele sabia fazer - fotografar. Só que dessa vez para esses jornais. Em pouco tempo, já familiarizado com a nova atividade, se tornava mais tarde o nosso primeiro fotojornalista da cidade.

Portanto, foram muitos os nossos fotógrafos que congelaram durante esses cem anos um pedacinho das Cajazeiras que eu vi, que você viu, que todos viram passar. Nogueirinha, João Luiz, Adonias Alexandre, o Moco, Almir, todos que já passaram ou estão passando, levando consigo, mas deixando para cidade um legado de grande valor, que precisa ser revelado, mostrado, exibido e fixado nas lembranças de cada cidadão cajazeirense. Que o trabalho do fotografo Zé Cavalcante seja continuo e que outras pessoas apaixonado por fotografia, venham está com ele nessa fileira, contando para nós a história dessa atividade na cidade de Cajazeiras.














LEGENDA DAS FOTOS
01. Retrato do fotógrafo Cícero Batista
02. O fotógrafo Cicero Batista em seu Laboratório
03. O jovem fotógrafo Nelson Lira do Estúdio Lira de Fotografias
04. A melhor pose do fotógrafo Francisco Aprígio Nogueira (Nogueirinha)
05. Fotógrafo freelance Bosco Pinto - Também o fotógrafo das sucursais.
06. Chiquitinha - A primeira mulher na atividade de fotógrafa na cidade (com o Governador João Agripino Maia)   
07. O fotógrafo Iraides no interior de sua loja Foto Recife
08. O fotógrafo Elias Paulo do Foto Rápido no seu laboratório
09. Porta Retrato para 3x4 Foto Estudio Silvanere Rocha
10. Os Freelances. Da direita para a esquerda os fotógrafos Djalma, Bosco Pinto e João Luiz
11. Cartão de Natal da Loja J.L. Braga, Criação do Foto Lira. Com imagens da loja e de Terezinha Morango-Miss Brasil e vice Miss Universo/1957.
12. Retrato do fotógrafo Zé Cavalcante
13. O fotógrafo Leopoldo Ferreira - Borracha, no canteiro central da Av. Presidente João Pessoa. Ao fundo, vê-se o Foto Lira. Década de 1950

CRÉDITOS
01. Todas as fotos dessa postagem pertence ao acervo do fotógrafo Zé Cavalcante

OBS: O uso do conteúdo desse texto, por terceiros, para produção de impressos e outras finalidades, sem a breve outorização do autor, implica e reclamação perante a lei. 
   

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terça-feira, 6 de setembro de 2022

UM CLIQUE PARA A ARTE

por: Mariana Moreira

O olhar sensível e educado consegue enxergar a vida pelas lentes e focos das câmeras que manuseia para além de cliques e imagens. Lugares e espaços da cidade revelados por outra dimensão mostrando passados vivos e esquecidos em frontais de casarões e beirais de casas modestas. Rostos singelos e expressões comuns de gentes que transitam ou vivem em ruas, praças, esquecimentos sociais ganham beleza na pujança de imagem que revela e esconde dramas e dores de uma realidade que exclui e esconde. Ontens e hojes no mesmo enquadramento de personagens e cenários capturados por olhos talhados de arte e afeto para enxergar o detalhe, traduzir o silencio, silenciar murmúrios e sons, que apenas se somam a uma fotografia.

Assim nos acostumamos a ver o trabalho do fotógrafo cajazeirense José Carlos Cavalcante Junior, mas que a intimidade da cidade o rebatizou apenas e afetuosamente Cavalcante Fotógrafo. Em várias exposições já realizadas ele traduz em imagens e recortes toda a sensibilidade do olhar que enxerga além da retina.

Mas, agora, ele nos surpreende com uma exposição sobre a história dos cem anos da fotografia em Cajazeiras. Em um minucioso e cuidadoso trabalho de pesquisa, Cavalcante Fotógrafo resgata imagens, biografias, equipamentos e câmeras, fotos e perfis daqueles que, neste percurso histórico, foram registrando avida da cidade e da região. Um registro que traz momentos de emoção com a identificação de cenários, com o reconhecimento de pessoas, com o rememorar de fatos ocorridos, com o recordar de lembranças que se fazem vida e viva.

Ali encontramos Nogueirinha e Chiquitita cobrindo os eventos sociais requintados da cidade em suas celebrações de bodas, batizados, aniversários, e nas festas de debutantes onde as “sinhazinhas” se mostravam para a vida adulta. Mas ali também estão outros tantos que, usando a fotografia e seu fascínio como ferramenta de sonho e memórias, vão registrando o cotidiano da cidade em suas variadas nuances.

E como me encantei e me emocionei com o relato do Cavalcante Fotógrafo sobre as peripécias de seu pai, também fotógrafo, e um dos que estão presentes na exposição. Ele relata que o pai, ao observar e se inteirar da montagem e funcionamento das câmeras sacos, aquelas usadas pelos famosos lambe lambe, passa a fabricá-las e também promover cursos de fotografias. O estúdio, sua própria residência. Os alunos pessoas simples, comuns, gente da roça e da cidade que, além das aulas, muitos ainda gozavam da hospitalidade do metre durante o curso, que durava entre um e dois meses.

A exposição do Cavalcante fotógrafo, portanto, não é apenas um amontoados de imagens e utensílios antigos. Mas histórias, que pulsa e vive como a repetir os versos do poeta: (...) abrir o ângulo, fechar o foco sobre a vida. Transcender pela lente do amor. Sair o cético, entrar num beco sem saída. Transcender, pela lente do amor. (Lente o Amor – Gilberto Gil)




fonte: Jornal A União

sexta-feira, 2 de setembro de 2022

ELA FOI EMBORA

por: João Batista de Brito

direitos da Imagem: es.123RF.com

Abri os olhos, espreguicei-me, respirei fundo, e me virei de lado para curtir só mais um pouquinho a maciez da cama.
Foi aí que vi. Ela não estava do meu lado. Ela que sempre acordava depois de mim. Bem depois.
Tudo bem. Devia estar no jardim, tomando sol, ou na cozinha, beliscando alguma fruta.
Lutando contra a preguiça, levantei-me, troquei de roupa, e saí do quarto no encalço dela. Na cozinha não estava, nem no jardim, nem no quintal, nem em parte alguma da casa. Estranho.
Será que fora caminhar no quarteirão? Ou tomara o rumo da praça do bairro, ou talvez mesmo da praia? Fosse o que fosse, era estranho: ela nunca fazia isso. Pelo menos sem me avisar, não.
Sem respostas, tomei meu banho de sol habitual, depois o de chuveiro, fiz o café de costume, e me dirigi ao gabinete.
Sentei-me à frente do computador, com a intenção de escrever minha crônica semanal, mas não saía nada. E eu sabia: sem ela, não conseguiria escrever uma única palavra, muito menos um texto.
Tristonho, deixei a manhã passar, na esperança de que, de repente, ela poderia retornar. Na verdade, passei o resto do dia nessa angústia, esperando que ela batesse no portão, de volta para o meu espírito limitado.
E nada. Uma vez bateram no portão: era o rapaz da Energisa, com a conta da luz, aliás altíssima. Outra vez foi a catadora de lixo, que pegou o vício da minha ajudinha. Outra vez, foi o motoboy, para entregar um livro que eu pedira à Livraria do Luiz, a Antologia de Luiz Fernando Veríssimo.
Mas, dela nem notícia.
Pois é. Dona Inspiração fora embora e me deixara assim, vazio, perdido, inútil.
Por que será que Dona Inspiração me abandonara, assim, sem mais nem menos, nessa quinta-feira ensolarada, justamente o dia em que mais preciso dela, o dia em que redijo minha crônica da semana para o Facebook e outros lugares? Por que desaparecera daquele jeito? Pura falta de consideração. Ou de misericórdia. Ela sabia muito bem que os meus leitores me aguardavam. Sabia que eles iriam estranhar se, na sexta-feira, bem cedo da manhã, não recebessem a notificação da minha crônica.
Acho que a fuga de Dona Inspiração tem a ver com esse ilusório momento de pós-pandemia em que estamos.
Por certo, Dona Inspiração deve estar achando – e, iludida ou não, é direito dela achar o que quiser - que não vale a pena ficar trancado em casa, a bunda pregada numa cadeira, a cara focada numa tela de computador, fazendo esforços mentais e físicos para redigir textos tolamente pretensiosos que deem a impressão de que sou inteligente e criativo.
Imagino que a essa altura ela deva estar curtindo o mundo lá fora, faceira, maliciosa, cheia de si, alheia ao covid e outros vírus, gozando da minha cara, e de meu espírito medroso.
A depender da hora, eu a vejo em locais diferentes, sempre bem mais atrativos – reconheço - que a minha monótona e mofada residência.
Daqui onde estou socado na minha tristeza, eu até a vejo, ao meio dia, num daqueles quiosques de Tambaú, de roupa de banho, tomando uma cerveja bem gelada, com tira-gosto de camarão, sentindo o vento nos cabelos soltos, fitando o marzão a sua frente. Ou, à tardinha, naquele terraço do Mag Shopping, lambendo um delicioso sorvete de chocolate suíço banhado com molho de baunilha. Ou, à noite, na calçada da Sapore d´Itália, se deliciando com uma pizza marguerita massa fina e vinho Leon de Tarapacá, divertida em observar o pessoal descontraído que, sem temores, passeia no calçadão...
Enfim, aos meus leitores do Facebook, peço desculpas pela falha, e prometo que, se a sorte me proteger e Dona Inspiração porventura retornar, na próxima semana vocês terão o que ler.
Aguardemos
.



fonte: João Batista de Brito - facebook