Bruno de
Lima: quais foram às origens do Padre Rolim?
Padre
Raymundo Rolim: o padre Inácio de Sousa Rolim era filho do casal
Vital de Sousa Rolim e Francisca Ana de Albuquerque, essa era natural do Rio
Grande do Norte e o Vital de Sousa Rolim era de Pernambucano, vieram do Ceará
para a Paraíba. Chegando a Cajazeiras, o casal foi residir primeiro no sítio
Serra Vermelha, depois no sítio Serrote, onde justamente nasceu o terceiro
filho, o Inácio de Sousa Rolim. Então observa-se o fundamento da família Rolim
na cidade e na região de Cajazeiras.
Bruno de
Lima: qual era a opinião geral do povo, seus
contemporâneos, sobre a vida do Padre Rolim?
Padre
Raymundo Rolim: a opinião geral das pessoas, conterrâneos e
contemporâneos de Inácio de Sousa Rolim atestavam que desde a menor idade, da
infância e da juventude, já era um jovem sensato, equilibrado, simples e como
diz um termo adequado, morigerado, quer dizer, de bons costumes, de bom exemplo.
Dessa maneira fez os primeiros estudos em Cajazeiras, em seguida foi estudar no
Crato, no Estado do Ceará, onde também aparece um testemunho muito bonito do
vigário do Crato, o Padre Saldanha, depois também do vigário da cidade de
Sousa, o Padre Costa onde o Padre Rolim também estudou durante um ano e em
todas essas etapas de seus estudos, de sua educação, está escrito nos livros o
testemunho do povo, que se tratava de um jovem de bom comportamento; ótimas
informações eram dadas sempre a respeito dele. No ano de 1822 (ele nasceu
em 1800) com 22 anos de idade ele ingressou no seminário de Olinda, no
Pernambuco, já para fazer os últimos estudos de Teologia e Filosofia. Apenas
estudou três anos e deu conta de todos os tratados de Teologia e Filosofia,
sendo ordenado padre em 1925. Depois de ordenado padre, ainda permaneceu lá no
seminário de Olinda, onde exerceu alguns cargos de confiança da reitoria e do
bispo de Olinda e em seguida ele ficou assumindo, após a sua ordenação, a
reitoria do seminário de Olinda.
Bruno de
Lima: qual e como foi a sua caminhada vocacional? E sua
ordenação?
Padre
Raymundo Rolim: A sua ordenação foi exatamente a sua caminhada vocacional
como eu já falei, tanto dos seus estudos como de seus testemunhos de vida
cristã, eram admirados por todos os co-legas e por toda a diretoria do seminário
de Olinda. Existe até uma carta comendatícia, quer dizer de recomendação dos
seus comportamentos, do bispo de Olinda, Dom Tomás Noronha, que, lida, todo
mundo entende, como se tratava de um jovem cheio de ideais e de virtudes que
deram lugar a sua ordenação que foi feita exatamente dentro de seis meses
quando recebeu todas as ordens sacras. Desde as ordens menores e as três ordens
maiores, subdiaconato, diaconato e o presbiterato, todos foram dados dentro de
um mês, pela a sua indiscutível competência. Não houve período de experiência,
para que alguém denunciasse qualquer coisa a respeito dele como é a regra,
porque todas as informações que vinham por onde ele passou, eram ótimas. Eram
de grandes virtudes e por isso mesmo a sua caminhada vocacional foi realmente
coroada de boas informações a respeito de um homem de Deus, de muitas virtudes.
Bruno de
Lima: qual sua missão de padre?
Padre
Raymundo Rolim: depois de ordenado ele permaneceu em Olinda como
diretor e professor do seminário, até 1829, quando aceitando, por obediência
eclesiástica, o pedido do bispo de Olinda e o bispo de três Estados: o Rio
Grande do Norte, da Paraíba e do Pernambuco. Mas o seu amor pelo sertão, sempre
aquela vontade de voltar ao seu rincão natal, aliado à carência de padres
dedicados na região, tudo isto o motivou a se dedicar também a maior
parte do seu tempo à educação religiosa dos jovens, mas, sobre tudo a dedicação
pastoral. Havia muitos padres naquele tempo envolvidos em política como também
envolvidos em várias atividades não sacerdotais, por isso havia muita falta de
padres no interior e ele resolveu com a licença do senhor bispo de Olinda, vir
para Cajazeiras em 1829, iniciando então a sua caminhada.
Bruno de
Lima: onde e quando exerceu a missão de educador na fé?
Padre
Raymundo Rolim: essa missão de educador na fé ele exerceu inicialmente,
como eu já havia dito, em toda a região do Ceará, onde percorria grandes distâncias.
Vale lembrar que essas viagens eram feitas a cavalo, sozinho. De Cajazeiras pra
o Inhamuns e até perto de Sobral, ele fazia missão apostólica, quando deixava o
seu pequeno educandário, que primeiro foi na escolinha da Serraria (em
Cajazeiras, na atual Rua Dr. Coelho), depois o colégio fundado já no povoado de
Cajazeiras ele deixava por conta dos professores, que eram as suas irmãs e
também alguns parentes que ele tinha e que trouxe do Recife e fazia essas
viagens, permanecendo três ou quatro meses em cada fazenda, onde havia uma
capela, ou se não havia ele improvisava um local onde celebrava e assim, fazia
a sua missão de padre. Nunca foi pároco, nunca foi vigário, mas fez essas
missões em toda a sua vida de clérigo (quase setenta e cinco anos de
sacerdócio), nos estados da Paraíba, do Rio Grande do Norte, na região do
Seridó, todo o Ceará e também em alguma região do Moxotó, no Pernambuco. Há
vestígios da estadia do padre Rolim longe, onde ele permanecia a serviço
daquelas comunidades abandonadas, num lugar onde um padre nunca pisava, mas
sempre com a santa intenção de atender aos pobres. Pobres que não podiam ir às
vilas e às cidades para fazerem casamentos, batizados e especialmente o
batizado dos escravos, que eram considerados pelos patrões (senhores de
escravos), como uma mercadoria e ninguém os batizavam e nem os casavam
religiosamente. Eram comprados e vendidos, que não era gente. O padre Rolim se
dava ao trabalho de batizar os escravos, tanto as crianças como os adultos e
fazer o casamento destes nas diversas fazendas e locais por onde ele passou a vida
inteira fazendo essas missões, dedicando especialmente aos mais abandonados.
Bruno de
Lima: em que demonstrou seu espírito de renúncia?
Padre
Raymundo Rolim: o espírito de renúncia do padre Rolim é
demonstrado, sobretudo na sua capa-cidade de deixar voluntariamente o seu bem
estar em prol dos próximos, ele sendo, como é do conhecimento do povo, um homem
culto como a história atesta, vale ressaltar que ele conhecia e falava pelo
menos dez idiomas diferentes. Inclusive idiomas, não só o Latim e o Grego
Antigo, mas o Sânscrito, que era uma língua em que não se sabe se esse povo
ainda existe. Pois bem ele foi convidado pelo próprio imperador D. Pedro II
para ensinar no Colégio Pedro II no Rio de Janeiro e ele recusou gentilmente,
não aceitou. Convidado pelo presidente da Província de Pernambuco para assumir
a cadeira de Latim e Grego no Colégio Pernambucano ele chegou a aceitar, mas
pouco tempo depois renunciou. Foi também chamado pelo presidente da Província
da Paraíba para assumir a secretaria de educação de todo o Estado, todavia
enviou uma carta agradecendo o convite do presidente. Quando recebeu do
imperador Pedro II duas comendas honoríficas benefícios outrora concedidos a
eclesiásticos pelo imperador em função do desempenho dentro do cenário nacional
como educador, diz o meu avô, sobrinho de segundo grau do padre Rolim, que ele
nunca usou essas comendas, essas medalhas de ouro, e pouco tempo depois ele as
levou e entregou a um amigo, o Desembargador Boto de Menezes, dizendo: “faça
disso o que quiser. Eu não uso isso. Isso não serve de nada”. De tal
maneira era a simplicidade de que o padre Rolim que o levava a recusar de
tudo que era pompa, tudo que era, vamos dizer riqueza, ou qualquer prestígio,
tudo renunciava e preferia ficar na singeleza de educador e como mero professor
do seu colégio de Cajazeiras e que se tornou um colégio de grande fama, pois
vinha alunos de todo o nordeste à Cajazeiras e além disso mantinha durante toda
a sua vida o espírito de desafetação na maneira de trajar, de tratar as
pessoas, igualhando-se a todos. Isso demonstrava exatamente o espírito de
humildade e renúncia do padre mestre.
Bruno de
Lima: de que modo viveu e como todos o viram na sua vida
de penitência e oração?
Padre
Raymundo Rolim: o que contam as pessoas que conviveram com ele,
não só os alunos e professores, podemos também elencar o notável Irineu Jofre,
que foi até presidente do Estado da Paraíba, todos reconheceram no padre Inácio
de Sousa Rolim o homem penitente e o meu avô também falava deste seu lado
asceta, ele tinha uma alimentação praticamente só para sobreviver, pois era
pouquíssima e sem temperos. Meu avô também contava que ele plantava algumas
carreirinhas de feijão no baixio do açude Grande e dali colhia umas vagens e
não comia carne de gado e nem de criação. Muitas vezes quando uma pessoa matava
um preá, que é um roedor pequeno, ele ainda dividia esse minúsculo animal em
três ou quatro refeições. Este lado penitente ele transmita também para os
alunos, ressalvando que tivessem o cuidado de não querer viver pra comer e sim
comer só para viver. Ele se dedicava a essa tarefa de prevenir os jovens desses
excessos. O padre Rolim nunca dormiu numa cama ou rede. A vida toda a família
conheceu e testemunhou como também os alunos, que ele dormia sobre uma mala
grande ou então em cima de uma tábua de madeira, dura e sem forro. Só na cabeça
se dava o luxo de colocar um livro, que meu avô dizia ser um livro volumoso com
um paninho em cima e em algumas vezes dormia no chão, sempre orando e
meditando.
Bruno de
Lima: como demonstrou a sua caridade de modo heróico?
Padre
Raymundo Rolim: todo mundo sabe ou já ouviu falar numa epidemia do
cólera morbus, que era uma doença fatal neste tempo. Praticamente não
escapava ninguém que contraísse essa doença e como não havia recursos na região
de Cajazeiras e, fala os livros, que até de Sousa vieram algumas fórmulas para
serem manipuladas por algum farmacêutico para pelo menos aliviar o sofrimento
do doente. Mas, em Cajazeiras, o padre Rolim fundou ao lado do colégio uma
enfermaria, na qual recebia centenas de pessoas e dava ele mesmo assistência,
arriscando a própria vida. Esse foi o sentido heróico de suas virtudes de
caridade para com aquelas pessoas que estavam ali dependendo dele até o último
momento da vida. Mais do que uma missão de religioso, ele fazia o papel de
enfermeiro para com todos os pobres de qualquer idade e qualquer situação.
Bruno de
Lima: onde, quando e como ele faleceu dando provas de
sua santidade?
Padre
Raymundo Rolim: a santidade do padre Rolim era conhecida em todo o
nordeste. Existe uma expressão que era bom verificar até onde isso era
realmente verídico, mas, existia na opinião geral de todo o povo que conhecia o
padre Rolim na Paraíba de que havia três padres, não eram de boa vida, eram de
vida boa no sentido de vida ilibada, vida limpa e que ninguém falava mal desses
padres. Eram os padres Frei Martinho, Dom Eurico, que era beneditino e o padre
Inácio de Sousa Rolim, em Cajazeiras. Sobre esses três padres ninguém nunca
disse qualquer coisa que viesse abater a sua moral e nem muito menos as suas
virtudes. Dessa maneira viveu a vida toda, todo mundo tinha esse conceito de
que o padre Rolim era santo porque toda a sua vida foi um exemplo de caridade,
de amor ao próximo, de renúncia e de penitência. Ele morreu em 16 de setembro
de 1899, com quase cem anos e dando um testemunho até o último momento de sua
vida de nunca ter se lamentado de todo o sofrimento dos últimos anos de vida e
das doenças que o acometeram. Morreu com esse odor de santidade. De tal maneira
que o povo do Nordeste quando soube do falecimento, quem pôde viajar à
Cajazeiras se deslocou até esta cidade que se encheu de gente de toda a região
para ver o último momento, antes do sepultamento do Padre Mestre e finalmente, vou
abreviar um pouco, houve o testemunho de um oficial de um cartório de registro
civil, que registrou um testemunho interessante e que está também no livro do
padre Heliodoro Pires e em outras edições de outros escritores que fizeram
biografia do padre Rolim, falaram que ele esteve depois de morto, durante mais
de quarenta horas dentro da igreja matriz à exposição de todas as pessoas que
queriam vê-lo e não havia sinais de putrefação de maneira alguma, pelo
contrário, houve quem dissesse que ele exalava um odor de rosas ou de algum
perfume. Isso era um sinal depois de mais de quarenta horas sem ser sepultado,
não dava sinais de putrefação ou de destruição do seu organismo.
Bruno de
Lima: onde e de que modo ele foi sepultado?
Padre
Raymundo Rolim: ele faleceu no dia 16 de setembro de 1899 e foi sepultado
no dia 18 de setembro, praticamente três dias depois. E seu jazigo se encontra
na igreja paroquial de Nossa Senhora da Piedade, que hoje é a igreja paroquial
de Nossa Senhora de Fátima e está sepultado até os nossos dias nesse mesmo
local. Existiram pessoas, eu até procurei corrigir um livro que foi editado no
bicentenário do padre Rolim, falava que os restos mortais do padre Rolim teriam
sido exumados em 1937, puro engano. O que foi exumado em 1937 foram os restos
mortais da mãe do padre Rolim, a mãe Aninha, que estava sepultada num túmulo na
parte de trás, ligado a parede da pequena capela do Coração de Jesus, que é
hoje a Praça Coração de Jesus. O prefeito Joaquim Matos mandou destruir a
capela e foram encontrados dentro desse túmulo, alguns restos mortais da mãe do
padre Rolim e foram levados e colocados na base do monumento do padre Inácio de
Sousa Rolim, que está hoje em frente ao Colégio Nossa Senhora de Lourdes,
chamada praça mãe Aninha. Mas os restos mortais do padre Rolim continuam lá
onde foi sepultado, dentro da matriz Nossa Senhora de Fátima. Só que nesse
tempo a igreja era pequena, não era do tamanho que é hoje, ela teria apenas uns
vinte metros de comprimento por doze de largura e o local onde está os restos
mortais pode serem identificados. Meu avô disse que assistiu ao sepultamento do
tio (padre Rolim), e foi exatamente para ele, que era povo, que ele foi
sepultado do lado direito do altar. Para os padres que se fizeram presentes no
ato do sepultamento, como o padre Joaquim Sirino de Sá e Manoel Costa estiveram
celebrando as exéquias e ele foi sepultado do lado esquerdo do altar, dentro
exatamente da nave central. Por tanto aí está a história contada e já relatada
em livros e que eu procurei resumir para que o povo tomasse conhecimento do que
foi, do que é realmente a vida, a história e realmente o testemunho de fé de
amor a Deus e ao próximo que deu o padre Rolim em toda a sua vida.
Bruno de
Lima: quais foram os milagres alcançados por sua
intercessão?
Padre
Raymundo Rolim: existem várias narrações. Uma delas está no jornal
Gazeta do Alto Piranhas e narra um milagre de uma criança, uma jovem,
adolescente, na cidade de Pau dos Ferros, no Rio Grande do Norte, veio com a
família a Cajazeiras em 1989 e pagou uma promessa no sítio Serrote, onde existe
uma capelinha onde padre Rolim residia e viveu seus últimos anos de vida, a
família veio com o testemunho de um médico que atestou que a moça tinha um
tumor na cabeça, fizeram uma promessa para o padre Rolim de Cajazeiras e com
poucos meses depois foram feitos novos exames e o tumor tinha desaparecido.
Então era sinal de que havia uma intervenção especial de Deus por intermédio do
padre mestre Inácio de Sousa Rolim.
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Antiga Matriz da cidade. Desenho feito pelo padre Raymundo Rolim |