sexta-feira, 31 de março de 2023

Belas fotos da atriz cajazeirense Marcélia Cartaxo, numa matéria exclusiva, publicada em língua inglesa



Marcélia Cartaxo (EXCLUSIVE)

por: Carla Di Bonito e Adriana Ellacott


Marcélia Cartaxo é uma das damas do cinema no Brasil. Nascida em Cajazeiras, pequena cidade do interior da Paraíba, essa atriz de corpo leve, mas de personalidade feroz corria solta pelas ruas quando criança, onde junto com um grupo de amigos, um teatro infantil, apresentando-se para os moradores locais, foi criado. Este foi o início de seu caminho para o estrelato.

Foi interpretando Macabéa no filme A Hora da Estrela, de Suzana Amaral, que Cartaxo conquistou um dos prêmios mais cobiçados do mundo - O Urso de Prata, de melhor atriz no Festival Internacional de Cinema de Berlim de 1986. Ela foi a primeira brasileira a levar um prêmio estrangeiro de tanto prestígio. O filme foi uma adaptação da obra-prima homônima da escritora brasileira Clarice Lispector.


Dessa personagem pura e ingênua, Cartaxo passa a interpretar Laurita, uma prostituta que divide um alojamento esquálido com um polêmico travesti negro (Lázaro Ramos) no aclamado filme “Madame Sata”, dirigido por Karim Ainouz e coproduzido por Donald Ranvaud.


Cartaxo foi fazendo outros filmes, mas foi no filme Batismo de Sangue, de Helvecio Batton, que conta a história de Frei Tito durante a ditadura no Brasil, que ela estava prestes a fazer outra atuação dramática.

Foi interpretando Pacarrete que Cartaxo voltou a ganhar o prémio de melhor atriz no Festival de Gramado, onde o filme foi premiado com 8 Kikitos, incluindo a sua personagem. O filme também foi aclamado no Festival Internacional de Cinema de Shangai.


Marcelia também trabalhou por trás das câmeras e dirigiu quatro curtas-metragens de sua autoria, expressando neles uma visão sensível e uma essência semelhante aos personagens que interpretou no passado e uma referência ao lugar onde nasceu no Nordeste do Brasil. O último trabalho de Cartaxo foi em 2021 onde ela interpreta Helen, filme de André Meirelles, que conta a história real de uma jovem e sua avó vivendo uma dura realidade em um dos primeiros quilombos de São Paulo. Seu filme mais recente inclui um papel principal no longa Lispectoriano, dirigido por Renata Pinheiro e Sergio Oliveira. Seus próximos projetos incluem Cangaço Novo, uma série de televisão produzida pela Globo. Além disso, Marcélia foi convidada para interpretar Raquel no filme Luzinete e eu, escrito e dirigido por Carla Di Bonito e produzido pela Boto Films e Underdogs Filmes - Brasil. O filme é um longa desenvolvido a partir do premiado curta-metragem Luzinete, contando a história real de duas irmãs e os diferentes caminhos que elas trilharam. 

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sexta-feira, 24 de março de 2023

O GRANDE EDUCADOR

por Lincoln Cartaxo de Lira

Prof. Antônio José de Souza. Imagem da Internet


No carnaval que passou, depois de uma boa caminhada, alternada com banhos de mar, conversa fiada e algumas cervejas geladíssimas, nada mais encantador do que puxar àquele bom bate-papo com um amigo/conterrâneo cajazeirense que não havia encontrado há tantos anos.

Costumo dizer que morre lentamente quem não preserva a sua história, os seus amigos, não troca de ideias, não troca de discurso, não se desperta na busca de novas amizades. Por isso, sou um aficionado por uma boa conversa, principalmente tipo daquela que remove o nosso passado de juventude e de infância.

Contato como esse, não há como falar de Cajazeiras sem citar os seus grandes educadores como, por exemplo, de seu fundador Pe. Inácio Rolim, do Bispo Diocesano D. Zacarias Rolim de Moura, que celebrou a minha primeira comunhão, do Cônego Luz Gualberto de Andrade, de Monsenhor Vicente Freitas e do intelectual e distinto professor Antônio José de Souza, carinhosamente chamado de “Titonho”.

Na condição de aluno, foi com ele, o nosso querido “Titonho”, que tive o prazer de sua convivência e de seus ensinamentos quando exercia então a função de secretario do Colégio Comercial Monsenhor Constantino Vieira e, às vezes, como professor, quando da ausência (em sala de aula) de algum outro mestre. Que saber? Não importava a disciplina, estava pronto para discorrer sobre qualquer assunto.

Sua sabedoria era abundante. Não a apenas como uma visão superficial das coisas. Qualidade que o levaria ser o maior cronista da cidade, com estilo inteligente e o deleito da leitura. Outro dia vi a sua foto na internet, engasguei. Foi como voltasse ao passado distante, e ao mesmo tempo tão presente em minha vida. Pelo seu perfil, a mesma postura e as mesmas roupas que ele usava: tecidos clássicos como o linho e a seda, com caimento impecável.

Nasceu na zona rural de Cajazeiras, sítio Cotó, hoje sítio Fátima. Em razão das dificuldades da época o impediram de concluir o ginásio, dedicou-se a ensinar o que aprendera. Abriu uma escola, inicio o exercício do magistério, fez-se professor. Quando ele se dirigia aos seus alunos não era ara fazer cabeças, mas para estimular e para reflexão.

Sim, é verdade. Toda a sua vida foi dedicada ao ensino. Ao ponto de casar-se com a vocação do magistério. Quem quisesse conhecer Cajazeiras, buscava o Mestre “Titonho”: um acervo vivo, uma memória prodigiosa. E se ele falou, está falado e garantido - assim manifestava os seus discípulos.

O inesquecível professor “Titonho” é o protótipo perfeito de educador concedido pelo jornalista Alexandre Garcia, quando disse que ser professor é um dom, é uma vocação. A pessoa nasce professor. E não tem que se envergonhar, a não ser com o salário.

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domingo, 19 de março de 2023

Serena de Ideais

por Cristina Moura

A tela mista faz nascer a vontade de estabelecer um diálogo ainda mais heterogêneo com quem vai receber a obra. Essa recepção não é somente para quem encomenda o quadro. Qualquer pessoa que estiver, em plena consciência, interpretando o que é exibido, passa a ser uma recepcionista do objeto. A partir do instante em que olha o que está criado, faz uma crítica, mesmo que não publique, mesmo que não conte ao vizinho.

Um dos pontos mais belos dessa viagem é saber que cada leitor interpreta de uma maneira. Algo positivo e natural. Algo único. Cada um analisa a mistura como puder. Chamo de tela mista o resultado de alguns elementos: tinta, tecido, linha, papel, miçanga, fita, botão, plástico e o que puder brotar com a inspiração. Certa vez, uma amiga me falou que não gostava desse tipo de intervenção, que achava pobre, que preferia somente as tintas. Outra vez, um amigo sugeriu que eu não pintasse mais com acrílica, que migrasse para óleo, argumentando que o produto final seria mais elegante.

Gosto de ouvir as críticas. Realizadas com cuidado, com certo carinho, noto um estopim para outros achados experimentais. O que faço com as telas é experimento, um teste prazeroso. Apesar de compreender certas técnicas, é a voz da intuição que chama mais forte. Foi depois de ouvir uma singela crítica, e examiná-la com paciência, que resolvi sair das minitelas. Quando comecei a pintar mais frequentemente, e com envolvimento mercadológico, não saía dos dez, quinze, vinte centímetros. Achava aquilo tão normal. Sugeriram que eu fosse aumentando o tamanho de forma gradativa, para que eu não me impactasse. Deu certo. Descobri, então, que a experimentação é também uma abordagem mental. Acreditei que podia avançar na metragem da criação. Acreditei e fiz. Veio um medinho bobo. Passou.

A concepção mista, contudo, ainda não chegou às telas maiores. É meu novo desafio nesse campo. Vale lembrar, até para mim mesma, urgente, que essa atividade é concomitante aos meus estudos acadêmicos. Os estudos são obrigatórios e obedecem a um prazo; as obras artísticas são livres e passam longe do calendário. Preciso dessas duas forças para manter um equilíbrio. As crônicas ficam na cola das duas vertentes, às vezes com cheiro de obrigação, às vezes mantendo um pacto com o espaço sideral da Literatura. Olho em mim, eu e o mundo, em cada palavra, cada vírgula, cada cor. Sou eu, Cristina. Pergunto. Respondo. Olho de novo.

Quando não consigo produzir muito bem uma coisa ou outra, sim, também sou eu. Poro a poro. Eu, aos pulos ou aos prantos, com uma extensa lista de painéis ainda brutos no cérebro, com pensamentos ainda nebulosos, com um coração manuscrito. É o eu dentro de vários eus. Pareço uma miniatura, eu, mais uma vez, numa enorme pausa, numa hibernação serena de ideias, numa sintonia com a correnteza. Comecei a respeitar esse intervalo, essa distância entre o pensar e o executar. Combinou. 

O material da tela mista em tamanho maior, por exemplo, faz tempo que está ali, me olhando. Diz, sorrindo: ei, criatura, precisamos surgir, precisamos de uma expressão, precisamos de uma vida, precisamos ser. É que o trabalho artístico torce para ser. Ser certificado, ser batizado, oferecer um título. Vence o que for mais adaptável. Na conclusão, aparece, então, um nome, um misto desse eu comigo. Não há dúvida. Sou eu, aos recortes, no quadro que se apresenta. Eu, acordada, em cada milímetro.


Título: Flores, 20x20, Painel. Técnica: mista (tinta acrílica e 
miçangas). Adquirida por Priscila Silva. 




Para ler mais textos de Cristina Moura, acesse: https://palavrasecores.blogspot.com/

terça-feira, 14 de março de 2023

Rolin, Rolim: da França a Cajazeiras.

por: Francisco Gil Messias

Hospital de Beaune - França. Foto: Francis Vauben

A história da família Rolim dá um romance. Mas essa não foi a opção do engenheiro e historiador paraibano Sérgio Rolim Mendonça ao escrever sobre sua ascendência familiar em seu mais recente livro, A saga do Chanceler Rolin e seus descendentes, publicado, em caprichada e bonita edição, pela Editora Labrador, de São Paulo. Talento literário para isso se fosse o caso, não lhe faltaria nem falta, à vista do que já mostrou quando da publicação de suas memórias (ou autobiografia), O caçador de lagostas, de 2018, pela mesma editora, e em outras obras anteriores. E o interessante nisso tudo é que sua formação acadêmica é na área das engenharias civil (UFPB) e sanitária (USP), cujos cultores, de modo geral, tradicionalmente são mais próximos da técnica e das tecnologias que das coisas da cultura.

Como explica o autor em suas Notas introdutórias, sua ideia original “era realizar apenas uma pesquisa a partir do padre Rolim até chegar à minha pessoa”, meta que, por si só, já seria ambiciosa, pois implicaria pesquisar toda a trajetória familiar, desde o ilustre educador cajazeirense até os dias atuais, percorrendo um período de mais de duzentos anos, haja vista que o padre Inácio de Sousa Rolim nasceu em 22 de agosto de 1800. Mas aí descobriu o chanceler Nicolas Rolin, da cidade de Autun, na região da Borgonha, França, e não conseguiu resistir à curiosidade inerente aos historiadores, terminando por ir conhecer, in loco, a cidade, a vida e as obras desse ilustre personagem francês, aventura que resultou no livro mencionado.

Nicolas Rolin, homem do século XV, apesar de nascido em 1376, e considerado “o primeiro Rolim famoso”, foi, antes de tudo, um empreendedor, no sentido público da palavra. Titular de cargos políticos importantes em sua região preocupou-se em criar instituições de interesse da coletividade, a exemplo de escolas e do famoso hospital de Beaune. Segundo o autor, “Rolin, desejando ampliar em sua cidade natal o círculo de uma educação muito limitada, fez abrir por intermédio de Felipe, o Bom, escolas públicas que se tornaram um importante centro de estudos literários e científicos na Borgonha, onde numerosos alunos ilustres estudaram”. Eis aí, certamente, a origem da genética educadora que viria, no século XIX, no sertão da Paraíba, desabrochar nas realizações notáveis do célebre padre Rolim.

Quanto ao hospital (Hospices de Beaune), destinado aos pobres da região, hoje é um museu de renome, permanecendo como testemunho concreto da visão benemérita de seu criador.

Do Rolin francês, o autor passa a identificar outros personagens com o sobrenome Rolim em Portugal, em Minas Gerais, onde se destacou, na Inconfidência Mineira, o padre José da Silva e Oliveira Rolim, de Diamantina, companheiro de prisão, em Lisboa, do célebre poeta Bocage, até chegar ao nosso padre Inácio de Sousa Rolim, cujo pai, Vital de Sousa Rolim I, é considerado o fundador da cidade de Cajazeiras. Encerrando o volume, Sérgio apresenta sua árvore genealógica, mostrando a vitalidade de sua linhagem, que promete estender-se indefinidamente no tempo, produzindo, esperamos todos, outros intelectuais, empreendedores e beneméritos.

É preciso que se diga que o livro possui interesse para além do âmbito familiar do autor, tratando-se de pesquisa histórica válida por si mesma e cujos resultados poderão ser úteis a outros estudiosos dos temas e personagens nela abordados. Essa é a riqueza desses trabalhos: nunca se esgotam em si mesmos, pois possuem sempre potencial de gerar novos estudos, numa corrente praticamente infinita de produções culturais relevantes.

Por fim, destaco a maneira elegante e isenta com que o autor desenvolveu seu tema no livro ora comentado, cuja específica matéria, em mãos menos modestas e sóbrias, poderia vaidosamente gerar obra de caráter auto laudatório.

O certo é que, com Sérgio Rolim Mendonça e suas realizações, pode-se dizer que o distinto clã do chanceler e do padre educador continua, com brilho, sua vocação de meritório protagonismo.



sábado, 11 de março de 2023

A KOMBI AZUL

por: Mariana Moreira


O nome era apenas Newton da Kombi. Ele e sua Kombi Azul entram em minha vida ainda na adolescência. Nas primeiras brumas das manhãs, em esporádicos sábados, dias de feira livre em Cajazeiras, ele era ansiosamente aguardado por meu pai, ou por minha mãe, quando vinham à cidade para acompanhar os filhos nos estudos, resolver pendências de empréstimos agrícolas e comprar alguns gêneros e produtos para o sítio, em Impueiras.

Saindo do Distrito de Iara, no Ceará, normalmente ao passar por Impueiras a Kombi já vinha com sua lotação máxima que, no entanto, não impedia a aceitação de mais um ou mais alguns passageiros que eram acolhidos com a gentileza e a alegria de Newton, mesmo viajando em espaços apertados, em colos ou em pé.

E a Kombi Azul de Newton me acompanha quando, universitária do curso de Comunicação Social, na UFPB, em João Pessoa, retornava a Cajazeiras e ai è casa paterna de Impueiras, em férias. E era sempre a Kombi de Newton o principal transportes. Sua alegria antecipava as saudades  dos pais. A prosa solta no percurso da viagem, o trato gentil com os passageiros, o arranjo para que todos se acomodassem mesmo com a lotação do veiculo esgotada, a dinâmica para arranjar a situação e dar um ar de normalidade na passagem pelo Posto da Policia Rodoviária davam o tom da viagem.

Mais tarde, já jornalista e trabalhando em emissoras de rádio de Cajazeiras, em vários finais de semana, ao ir para Impueiras, era com Newton que fazia o percurso, já deixando apalavrada a vaga do retorno na segunda-feira, logo cedo. Já conhecida por minha atuação profissional e meus escritos, com alguns já me nomeando “Mariana da Raida”, ela sempre deixava um lugar especial para mim e, no percurso, ia sempre puxando prosa.

Sua gentileza ia além da acolhida na sua Kombi. Muitas vezes, voltando da cidade com algumas compras mais pesadas, com rolos de arame farpado, sacas de arroz que fora levado para “despolpar”, meu pai recebia de Newton a garantia de percorrer cerca de meio quilometro de ladeiras entre a BR-116 e nossa casa em Impueiras, para deixar os produtos.

Mas a velhice chega e exige de Newton a aposentadoria. Nas curvas da BR-116, na saída da estrada do Distrito de Fátima, ou estacionada em frente à Bodega de Jaime, na Rua Padre José Tomaz, em Cajazeiras, sua Kombi não mais está. Uma Kombi já velhinha cujas portas já eram fechadas com ferrolhos. Também não mais encontramos Newton e sua alegria.

Mais tarde, o encontro em uma solenidade religiosa na Capela de Fátima. O reencontro dá-se com o mesmo entusiasmo. Estacionada em canto do terreiro, sua inseparável Kombi Azul.

Anos mais tarde, sentido sua ausência naquela paisagem, sou informada de que a vida lhe roubou a capacidade de discernimento e conhecimento. Ora, que nada, pois ainda hoje me lembro de sua Kombi Azul e sua inseparável alegria quando percorro os caminhos entre Cajazeiras e Impueiras, buscando as saudades de meus pais, que também já se encantaram.


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fonte: Jornal A União, edição de 10/03/2023. Desenho vetor, fonte: Depositphotos