Em 1985, se achava Zé do Norte no sertão da Paraíba como homenageado do Festival de Artes da Paraíba, que naquela ocasião a sede era em Cajazeiras - sua terra natal. Muito bem a vontade no miscigenado clima agreste do Brejo da Freiras, o artista recebeu a visita da jornalista Mariana Moreira, para uma converso amistosa sobre sua vida, carreia de escritor e relações com Cajazeiras. Veja como foi esse encontro, publicado no Jornal A União do dia 22 de maio de 1987, página 09, Segundo Caderno.
Seu nome sofre o ostracismo nocivo dos modismos
efêmeros que vagueiam os lances da cultura dominante, reservando planos pálidos
para criatividades e talentos. Os estilos padronizados e sincronizados escritos
nos evangelhos da Globo não se afinam com seu “arre égua”, conservado como uma
das mais nítidas e fortes evidencias de sua origem nordestina e agreste; mesmo
com os 50 e tantos anos de vivencia carioca. Esse é Alfredo Ricardo do
Nascimento: um nome desconhecido, detentor de uma fértil biografia de soldado
do Exército, guarda mata – mosquito, ator, compositor, animador de programas
radiofônicos em estilo sertanejo e, acima de tudo, um narrador de sua vida e de
sua gente. Como Zé do Norte seu nome está associado ao filme O CANGACEIRO”, de
Lima Barreto, a universal MULHER RENDEIRA e a tantos flagrantes de nosso
existir cultural.
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Agora, Alfredo Ricardo do Nascimento lança AS
MEMÓRIAS DE ZÉ DO NORTE, uma autobiografia feita ao estilo das velhas e
amareladas estórias de trancoso contadas na boca de noite penumbra de alpendre
nordestinos e com sabor das de cangaceiros e romeiros que povoam tantas
lembranças de tantos sertanejos, na malícia de um “paraíba” descobrindo o Rio
de Janeiro e a cidade grande.
Escolhido como Patrono do nono Festival de
Artes da Paraíba, em 1985, Zé do Norte esteve em Cajazeiras, sua terra natal.
No clima agradável e destoante do Brejo das Freiras ele deu esse depoimento a
jornalista Mariana Moreira. São flagrantes que Zé do Norte apresenta em suas
MEMÓRIAS, e que antecipamos agora.
Mariana Moreira
“Eu nasci no Sítio São Francisco. Meu pai foi
rendeiro daquela fazenda, que pertencia ao velho Guimarães, avô de Dr. Otacílio
Jurema. Eu vivi duas fases: de seca e de inverno. A primeira seca que tomei
pelas “fussas” foi a de 1915. Eu era garotinho, não me lembro de tudo, mas
guardo o sofrimento, porque no início aconteceu uma epidemia de varíola, que se
chamava “bexiga” naquela época. Morria mais gente do que peixe envenenado. Não
tinha socorro médico de jeito nenhum. Eu morava em Cajazeiras, na rua do
Cemitério. Minha mãe era costureira. Eu era um menino sardento, com cabelo
caju. Passou então um velho (piauizeiro) lá em casa e ensinou o remédio contra
a bexiga, que era beber uma caneca do esterco da vaca, logo após ela ser ordenhada.
Era para aparar o esterco antes dele cair no chão, com urina e tudo, misturar e
beber. Eu me escondi, mas mamãe me deu aquela caneca de caldo verde. Só sei que
todo mundo que bebeu escapou. Na seca de 1919 veio a gripe espanhola. Morreu gente
como o diabo. Nessa época eu morava onde hoje é Santa Helena. Meu padrasto,
então, mandava fazer chá de quina (que nós chamávamos de quina-quina) bem forte
e dava prá todo mundo. Salvei gente como o diabo”.
Meu
Sonho era aprender a ler
“Uma noite de agosto de 1925. Cajazeiras vivia
a festa da Padroeira Nossa Senhora da Piedade. Sentado na calçada, ouvindo
abanda tocar, disse ao meu primo Zé Bombinha: - Vou embora daqui. Cajazeiras
não tem recursos e lá quero estudar. Eu tinha um dinheirinho junto. Comprei a
passagem de trem para Fortaleza. Quando ia saindo de Cajazeiras quis desistir e
meu primo não deixou, me aconselhando saltar em São João do Rio do Peixe (hoje
Antenor Navarro). Não desisti e chegando em Fortaleza fomos dormir no Morro dos
Moinhos, pagando 500 réis para armar a rede. Era um lugar de bandidos. Me
empreguei no Café Emídio, na Praça do Ferreiro, ganhando 60 mil réis por mês
para lavar pratos e fazer café. Depois passei a trabalhar no salão do Café,
sempre almoçando num mercadão ali existente, que servia uma gostosa panelada.
Comia que só filho de ladrão quando o pai está solto. Nas horas vagas ia pró
Passeio Público ouvir a Banda de Música do Corpo de Bombeiros. Vendo o mar me
deu vontade de entrar no “exerço”. O meu primo já tinha sentado praça na
Polícia. Certo dia me deparei com um sargento sentado no Passeio Público. O
confundi com um Capitão e disse: - Capitão, quero entrar prá o exerço prá ir
pró Rio de Janeiro e estudar. Perguntando de onde eu era, o sargento descobriu
que também era de Cajazeiras e me levou ao comandante do XXIII Batalhão de
Caçadores, onde sentei praça com destino ao Rio. Embarquei no navio Pará,
levando 18 dias de viagem, enjoando como todo marinheiro de primeira viagem. No
Rio fui servir no Regimento de Infantaria, na Vila Militar. Após um ano dei
baixa, entrando na Escola de Aperfeiçoamento de Oficiais, como enfermeiro,
servindo dois anos. Em 1929 dei baixa para casar. Me enrabichei por uma
espanhola que morava no Morro da Mangueira. Não chegue a casar com ela que
morreu de apendicite, doença que era quase mortal naquela época”.
“Naquela época todo mundo morria de apendicite.
Só que eu escapei. Fui operado em 1928 e, dos 18 operados no mesmo tempo apenas
eu sobrevivi. – Eita diabo, vim lá do Sertão sobrevivendo a toda sorte de
epidemia e me livrei da apendicite. Na operação, porém, aconteceu um caso
engraçado. De manhã cedo, no dia da cirurgia, tomei banho, fui a missa e comunguei.
Quando os médicos estavam me operando resolvi pregar uma peça, prendendo a
respiração, Ihh... foi um reboliço danado, todo mundo pensando que eu tinha
morrido. Depois, bebi a borracha de gelo colocada em cima da operação, vomitei,
arrebentou vários pontos, a cirurgia supurou e fui colocado no isolamento, pra
morrer. Superei tudo e ainda em 1930 fui operado de uma hérnia; em 1972 me
submeti a uma cirurgia de próstata e, em 73, operei a hérnia esquerda
estrangulada. O que me prejudicou mesmo
foi uma efizema que apanhei m 1983, por causa do cigarro”.
Mulheres:
Gosta de Todas
“Não cheguei a casar com a espanhola, que
morreu em 1930. Aí apareceu namorada de todo jeito, mas a enchente mesmo foi
quando comecei no Rádio, em 1939. Tinha um paraibano, proprietário da fábrica
de cera e óleo Universal, que me patrocinou. Eu ganhei, naquela época, 12
contos de réis, que era dinheiro como diabo. Arre égua... mandei fazer roupa do
linho, comprei um sapato da moda, gravata e camisa de seda. Aí começou a
encrenca como a minha mulher. Eu tinha casado em 1931 com uma carioca. Tenho
nove filhos. Seis da primeira mulher e três da segunda. Atualmente sou
desquitado. Tenho também três filhos fora do riscado. São os três homens; o
resto é tudo mulher. Os três que são machos, todos tocam e cantam, mas nenhum é
profissional. Já tenho bisnetos. Gosto tanto de mulher que namoro até com a
lua, a quem prometi casamento na música “Lua Bonita”. Se não fosse esse troço
de efizema eu ainda estava inteirinho, pois sempre nadava 500 metros todos os
dias, da Praia do Botafogo ao Icaraí. ”
Porta
– Voz do seu povo
“Como veio o meu nome Zé o Norte? Ah... isso é
importante. Eu sempre fui um leitor de Gustavo Barroso. O João do Norte. Então,
quando fui fazer o meu primeiro show, na Rádio Tupy, em 193, os apresentadores
(Paulo Gracindo e Manoel Barcelos) perguntaram qual o meu pseudônimo. Então,
depressa me inspirei no João do Norte e disse: ZÉ DO NORTE. – Mas, porque Zé do
Norte? Perguntaram. – Porque eu sou do Norte e quero defender a música do meu
povo. Eram telefonemas perguntando e onde eu era. Se do Ceará, porque eu tinha
dito que era a fronteira da Paraíba com o Ceará. Eu disse então que era de
Cajazeiras, e ninguém nunca tinha ouvido falar desse lugar. Aqui nessa cidade
de Cajazeiras eu trabalhei no Café de João Bichara, pai de Ivan Bichara,
ganhando 50 mil réis por mês. Dali fui para o Colégio do Padre Gervásio Coelho,
onde fazia o serviço da limpeza em troca e estudo. Aos 16 anos aí para
Fortaleza. ”
Crime
do Marechal
“A figura popular de Cajazeiras, naquela época,
era o Neinha, que colocava apelidos em todo mundo. O BUTIJÃO, por exemplo, era
um sujeito muito baixo, forte, o pescoço curto, parecia um holandês; e a mulher
ele, alta e magra. Então foram apelidados por Neinha como BUTIJÃO e BORBOLETA.
Eles moravam perto da ponte que vai para ao Diocesano e, na época da sangria,
os alunos iam tomar banho ali e ficavam gritando. Borboleta, Butijão... e
cantando: “jaca é fruta boa/banana não tem caroço/nem borboleta tem dente/nem
botijão tem pescoço.” Eita diabo, eles ficavam danados. Eles tinham dois filhos
que também tinham apelidos: Borboletinha e Gabiru. Butijão era o zelador do
Mercado antigo (que hoje ainda existe). Em 1916 houve um crime lá dentro. O
Marechal matou o sargento Henrique, porque este lhe deu um tapa na cara, após
ter chamado o Marechal para jogar e este ter dito que não jogava com um
policial. Era noite de festa e eu estava olhando o movimento e, na hora do
rime, sai na carreira e fui me esconder na casa de Raimunda Lalau. Dormi lá e, bem cedinho, ela me deu café com
tapioca. Acordei de madrugada com Raimundo Doido que vinha cantando no meio da
rua: “já tomara/já tomara/já tomara de manhã/eu já”. Ele andava com dois ossos
(tíbias) e dizia que era do seu avô, o Velho Tomás, que costumava lhe bater,
quando vivo. Marechal não foi a julgamento, tenho passado um tempo no Barro
(Ceará), protegido pelo Major Zé Inácio, que era uma espécie de coronel”.
“Depois dessa onda de Rock, de discoteque, as fábricas se
interessaram mais por esses estilos, mais comerciais e desprezam a verdadeira
música brasileira. Os artistas gravam, mas não vendem. O falecido Jackson do
Pandeiro gravava, mas não vendia. O único que ainda vende qualquer coisa é Luiz
Gonzaga. Os outros ficam nessa situação. Inclusive eu. Muita gente gravou
composições minhas, como o Caetano Veloso, que gravou Sodade, meu bem, sodade,
fiz muitas músicas e uma delas, Vou Girar, é um pouco da minha vida. É de uma
importância fabulosa, porque é uma espécie de ensinamento que deixo para a
juventude. Eu digo: “Menino quem é seu pai/ o meu pai é Nosso Senhor/ Menino
quem é sua mãe/ minha mãe e a mãe do Redentor/ menino diga aonde vai/ pelo
mundo eu vou girar/ tenho muito que aprender/ tenho muito que ensinar... “. O
meu livro O Lobisomm de Cajazeiras está parado; deram uns tiros nele. Na época
em Burity era secretário de Educação deu a verba, mas Deusdedith Leitão foi
muito moroso e deixou passar. Os originais estão comigo. E tem um outro, A
vingança da Negra Ouro, sobre a escravidão."
"Nas Memorias de Zé do Norte eu conto porque
Lampião nunca entrou em Cajazeiras. Quem entrou foi Sabino, mas não chegou a
dominar a cidade, que naquela época vivia sempre ameaçada por cangaceiros. Em
1923, depois da passagem de Luiz Padre, que roubou a mulher de Osório do Cipó e
castrou Justino Neco, em 26 Lampião escreveu uma carta para Joaquim Peba,
pedindo 20 contos de Reis. Joaquim Peba não enviou o dinheiro, tampouco Lampião
veio buscar. Sabino, que tinha sido cabra de Marcolino Diniz (comerciante em
Cajazeiras), conhecia a cidade todinha, como também seus homens importantes. Na
época ele era o braço direito de Lampião e, ao retornarem do Rio Grande do
Norte, desafiou seu Chefe a invadirem Cajazeiras. Lampião se recusou e disse
que se sabino quisesse entrar na cidade, que viesse sozinha. Lampião não
entrava em Cajazeiras a pedido do Padre Cícero do Juazeiro, que lhe deu a
patente de capitão e que tinha sido aluno do Padre Rolim, nessa cidade, e que
pediu a ele (Lampião) para nunca atacar Cajazeiras. Sabino cismou e entrou pela
rua da Matança tocando fogo de imediato, na casa de Martim Barbosa. Depois
encontrou um soldado que vinha com uma cabra, pertencente a uma velhinha e que
ele trazia como pagamento de imposto. Ao encontrar-se com o soldado, e também
com a velhinha em prantos, sabino matou o policial com a arma dele (soldado) e
devolveu o animal a velhinha, que saiu bendizendo: “Deus dê a salvação a
Sabino”. Essa cena serviu de base para algumas tomadas do filme O CANGACEIRO.
Ainda na rua da Matança, Sabino matou o popular Ciço Pé-de-Cágado, que tinha
esse apelido porque tinha os pés de pomba. Os cangaceiros vieram correndo até a
casa Matos, na Praça da Igreja Coração de Jesus. O tenente Elísio, delegado da
cidade, só de pijama e cartucheira, da torre da Igreja atirava nos cangaceiros,
conseguindo ferir dois, que os companheiros levaram. Fugindo a reação os
cangaceiros saíram pela rua da Tamarina e foram para a casa do major Sobreira,
atacando dois empregados que faziam a proteção. Depois foram para a usina de
descaroçar algodão, onde Sabino ateou fogo. O povo de Cajazeiras reagiu
espetacularmente, pois a cidade só contava com seis policiais e o tenente. A
reação foi grande e até a usina de luz ajudou, porque ao disparar os
cangaceiros pensavam que era um fuzil. Por volta da meia noite os cangaceiros
foram embora e, oito dias depois, encontraram em Marias Pretas, perto do
Patamuté, dois cadáveres enterrados, dos cabras de Sabino”.
“O folclorista Flávio de Andrade escreveu
diversos livros e um deles, aborda a questão da mulher rendeira, que ele colheu
no litoral da Bahia. Por ser uma tradição proveniente do espanhol ele botou
olé. Depois viu que aqui não se cantava olé; ora olé, “Olé mulher rendeira/ olé
mulher renda/ chorando por mim não fica/ soluçou vai no borná”. O arranjo que
eu fiz, “olê mulher rendeira/ olê mulher renda/ tu me ensina a fazer renda/ que
eu te ensino namorar”, foi registrado no estrangeiro e em toda parte e é a que
está prevalecendo. Eu tinha um jumentinho, chamado Macaco, e eu vendia água na
rua na época em que Sabino entrou em Cajazeiras."
A
verdadeira mulher rendeira
"A carga d’água com quatros latas era vendida
por 300 réis. Eu protestei contra o trecho da Mulher Rendeira. Eu disse: - um
dia o povo de Cajazeiras vai protestar contra isso porque Lampião nunca entrou
na cidade. Essa estrofe saiu depois, no filme. O cara fez o arranjo botou esse
negócio. É uma distorção. No original não tem isso. Eles fizeram sacanagem com
o registro de Mulher Rendeira. Eu vim pró Rio de Janeiro e lá em São Paulo o
Lima Barreto registrou a música como de domínio público, mas o empresário
registrou no exterior como minha, e a Editora Bandeirantes registrou no
Conservatório Nacional de Música, prevalecendo meu arranjo. Do estrangeiro quem
me paga mais direito autoral é a Alemanha, depois a França e o Japão. Eles são
doidos por Mulher Rendeira, que chama de Cangaceiro, mas gostam também da
música Meu Pião.”
Dificuldades
da Memória
“Foi muito difícil publicar As Memórias de Zé
do Norte. Eu assinei contrato com a José Olímpio Editora, mas a percentagem era
muito pobre, 10 por cento. Não assinei o contrato e disse: - se é para fazer
cultura, eu faço, mas não dou lucro a ninguém. Nesse interim, morre o José Olímpio
e a editora foi vendida. Os novos proprietários botaram uma série de
dificuldades e eu fugi da linha. Fiz então um contrato com a Editora
Continente, onde paguei 10 milhões pela edição de mil livros. Eu podia ter o
prefácio de Raquel de Queiroz ou de outro nome famoso da nossa literatura, mas
não quis isso, achei que seria uma apelação para o livro vender. Então botei um
que não é conhecido, mas é fabuloso, o Paulo Armando. No Livro conto coisas de
Cajazeiras, coisas de Lampião e de cangaceiros, como também meus passos pelo
Rio de Janeiro. ”
“O Jorge Amado eu considero um crânio, mas
gosto também de José Lins do Rego e de alguns escritores estrangeiros. Eu hoje
vivo dos rendimentos dos direitos autorais de minhas músicas executadas no
Brasil e no exterior e de uma aposentadoria do INPS, como cantor e compositor.
As melhores recordações que guardo são dos tempos que era guarda mata-mosquito.
Tem uma passagem gozada, que conto n´Às Memórias do Zé do Norte, que é do homem
que não gostava do mata-mosquito. Era o marechal Setembrino de Carvalho. Eu fui
lá e constatei um foco de mosquito em sua casa e perguntei a empregada pelo
patrão (eu lá sabia quem era). Ele vinha descendo as escadas e disse: - O que
você quer com o patrão? Respondi: - Meu patrão, encontrei um foco de mosquitos
em seu quintal e vou levar para a repartição. Ele reagiu, ameaçou chamar a
polícia, mas eu fui embora com os mosquitos. Deu um reboliço danado, com o
conhecimento do diretor de Saúde Pública, Clementino Fraga, e foi parar no
Ministério da Guerra. ”
“Gastei
dinheiro e não sou vereador”
“Não gosto de política. Fui candidato a
vereador, no Rio de Janeiro, em 1950, pelo PST (Partido Social Trabalhista), só
tirei trezentos e poucos votos, porque estava rompido com o Lutero Vargas, com
quem fiz a campanha do queremismo, e também porque me registrei no Tribunal
Eleitoral como Alfredo Ricardo do Nascimento e todo mundo só me conhecia como
Zé do Norte. Rompi com Lutero Vargas porque ele, como médico, se recusou a ir
receitar a mulher de um operador da Rádio Tamoio, onde eu trabalhava na época.
Como o Tribunal não aceitava a inscrição do pseudônimo dos candidatos, aí eu vi
que ia perder e levei o negócio na brincadeira. Na apuração, já me sentindo
derrotado, entrei no Tribunal todo de branco, fumando um charuto e cantando: “Aí
doutor, aí doutor/ gastei meu dinheiro todo/ e não sou vereador”. Muita gente
me xingou. Hoje, não acredito nessa confusão que tá aí. Uma tribuzana; três encrencas:
a abertura, que foi uma negação; a morte do Tancredo Neves e, o José Sarney,
porque não vai resolver nada e vai fazer coisa que não devia fazer, nomeando
parentes, nomeando uma porção de ladrões. Figueiredo deixou ladrões e ele vai
ser pior. A situação econômica do Nordeste, que devia ser resolvida primeiro,
não resolve. O Nordeste hoje tá uma beleza, mas deve-se aos governos da
Revolução. Mas agora, com essa promessa do Sarney de salvar a situação da
região, de dá privilégios ao Nordeste, vamos ver se dar sorte. Se fizer e der
certo eu digo: valeu”.
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Ilustração: Deodato Borges
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