Com mais tempo para dedicar-se
à literatura, ao deixar a vida pública, Ivan Bichara produziu os romances
“Carcará”,(1984) Tempo de Servidão (1988) e “Joana dos Santos” (1995). Ninguém
melhor do que ele, narrou as peripécias de uma polícia desaparelhada,
desassistida pelos escalões superiores e armada apenas com a cara e a coragem,
para enfrentar os cangaceiros, que, aos bandos, intimidavam o sertão.
Há alguns anos a Paraíba
reverenciou a memória de Ivan Bichara, quando da passagem do centenário do seu
nascimento. Em um dos eventos em suas homenagens, fui chamado à tribuna e
aproveitei para preencher a lacuna que observei em todos os discursos. A referência
ao fino humor que Ivan Bichara cultivava, quer na convivência com seus pares,
quer nas páginas dos seus romances.
Na ocasião, repeti alguns
fatos que comprovam o mencionado acima. Vou registrá-los mais uma vez nesse
trabalho que se recomenda curto.
O líder do seu governo, (eu
era vice-líder e iniciante na AL) deputado Evaldo Gonçalves, cansou de ouvir as
queixas dos seus liderados sobre fatos do governo Bichara que levaram a bancada
de sustentação ao descontentamento. Resolveu tratar do assunto com o chefe do
executivo
Foi marcada uma reunião em
Palácio. O governador, sentado em amplo sofá sob o quadro da prisão de
Peregrino, tinha ao seu redor cerca de vinte deputados. Cada um apresentou seu
queixume e o paciente Bichara apenas ouvia. “Ele sabia ouvir como ninguém” disse
Germano Toscano, seu chefe de gabinete. Terminada a cantilena parlamentar, foi
a vez do governador falar:
– Vocês não estão satisfeitos
com o meu governo? Pois vou lhes confessar uma coisa: eu também não estou!
Os espíritos foram desarmados
e as armas ensarilhadas…
Em uma de suas visitas ao
Poder Legislativo, ficamos a lhe fazer sala no gabinete da presidência,
enquanto não se iniciava o evento. Eu, Waldir dos Santos Lima, Edvaldo Motta,
Sócrates Pedro e Orlando Almeida aproveitávamos para encaminhar alguns assuntos
do nosso interesse. O deputado Sócrates Pedro, como se sabe, era cunhado do
empresário Walter Brito proprietário da empresa de ônibus Real e intermediário
dos seus assuntos junto ao governo. No meio do papo, o deputado Orlando Almeida
começa a narrar um fato que se passara em Campina Grande. Meio prolixo, Orlando
demorava muito a concluir, buscando detalhes desnecessários. Impacientei-me e
adverti o querido colega:
– Orlando, o governador é
muito ocupado. Apressa essa conversa: para chegar em Campina você está
arrodeando por Princesa Isabel…
O governador riu da minha
pilhéria e fez a dele:
-Fala baixo, Ramalho, se não o
Sócrates vai querer registar essa linha de ônibus…
Na campanha municipal de 1976,
uma vereadora da capital, já sexagenária e sem muita disposição para a luta,
procurou-o para pedir ajuda. Na conversa, lembrou ao governador que sua
principal concorrente era uma linda jovem, quase dois metros e como muita disposição
para pedir votos e, acrescentou:
-É uma luta desigual, Dr.
Ivan!
-Realmente é muito desigual,
respondeu Ivan.
Sua incursão pela literatura
como vimos antes, deixou vários romances e ensaios. Em um deles, o romance
Carcará, um personagem conta a história de um trabalhador, casado com moça nova
e recentemente saída do parto. A mulher procurou o médico levando a criança
raquítica, mas parecendo um produto daqueles países africanos onde a fome é
quem dá as ordens. O médico admirou-se da fragilidade da criança e destacou:
– A senhora com tanto leite e
deixa seu filho nesse estado?
A resposta da aflita mãe,
retrata o humor de Bichara, também presente na sua obra.
Nenhum comentário:
Postar um comentário