sábado, 20 de setembro de 2025

AULAS PARTICULARES

João Batista de Brito


Estudante do Liceu Paraibano nos anos cinquenta, ele era um bom aluno, mas estava em maus lençóis em uma das disciplinas: Francês. Sua vocação para línguas estrangeiras era nula e o professor, um chato de galochas, era exigente.

Sem ver outra saída, pediu aos pais o luxo de uma professora particular. E conseguiu. Duas vezes na semana ia à casa dessa senhora de meia idade, que lecionava na Aliança Francesa, mas, eventualmente, dava aulas privadas, em sua residência, para alunos em dificuldade escolar.

Se estava fazendo progresso não sabia, mas que estava deslumbrado, estava. Não com as aulas, mas com a professora, a mulher mais bela em que já pusera seus olhos adolescentes.
Nas aulas, naturalmente sentavam juntos, bem pertinho, os dois a sós numa das salas da casa, lendo o mesmo livro, a mesma página; ele, sentindo o perfume de seu corpo, absorvendo o seu hálito quente, os braços, ou os joelhos, acidentalmente se tocando.

Era tanta emoção que dificultava o aprendizado. Quando, para demonstrar a difícil pronúncia das vogais francesas, a professora o fitava de frente, bem de perto, e fazia aquele biquinho típico dos francófonos, seus lábios se fechando num círculo, como se fosse beijá-lo, ele delirava de excitação. Ela, com seu biquinho sensual, exemplificando a pronúncia com formas verbais como “je veux, tu veux”, e ele colocando, nessas formas verbais, objetos diretos imaginários.

Que estava aprendendo um pouco da língua de Balzac, estava, porém, o esforço era grande para não perder o juízo por uma mulher mais velha. Na escola, na rua, em casa, a imagem da professora particular não lhe saía da cabeça, dia e noite, noite e dia. E essa imagem – como não? - passou a intrometer-se nos seus prazeres solitários. Antes, esses prazeres eram habitados pelas fêmeas das telas, Sofia Loren, Brigitte Bardot, Anita Ekbert... Agora, era a professora que reinava.

Um dia, conheceu o marido da professora, que voltou do trabalho mais cedo, e os dois foram apresentados. E ficou espantado com o contraste: como é que uma mulher perfeita como aquela, podia ter casado com homem tão feio? Calvo, sobrancelhas grossas, narinas arregaçadas, barrigudo, quase sem pescoço... E, claro, a feiura do marido acentuava a beleza da esposa.

Estava nessas cogitações quando ficou sabendo que o casal tinha uma filha, que, por sinal, também estudava no Liceu, pela manhã. Animou-se com a notícia e decidiu que procuraria a moça, que devia ser, com certeza, tão formosa quanto a mãe, ou mais. Era sua chance de desviar o seu desejo, da mãe para a filha.

Apelando para a moça não já ter namorado, foi ao Colégio no turno da manhã, hora de recreio, e procurou-a nos corredores. Indaga daqui, indaga dali, finalmente a viu e...

Um segundo susto: ao invés da beleza da mãe, a moça tinhas as mesmas sobrancelhas grossas do pai, as mesmas narinas arregaçadas, a mesma feiura. De todo jeito, apresentou-se como aluno particular da mãe, e, sem convicção, iniciaram uma conversa casual. A moça – tudo indicava – gostou daquele aluno particular da mãe, rapaz vistoso, mas ele, nem pensar.
Por fim, um mês e meio passado, chegou-se ao término das aulas particulares. Da professora despediu-se com um “au revoir” engasgado.

No Colégio, foi aprovado em francês com uma nota razoável, que compensou as despesas dos pais. Mas aí, fez à família imediatamente outro pedido: queria prosseguir com os estudos do francês, e gostaria de matricular-se na Aliança Francesa, ali na Lagoa.

Quando, na secretaria da Aliança, ficou sabendo que a sua professora só lecionava nas turmas de nível elevado, desistiu da matrícula. Desistiu, mas aos pais não devolveu o dinheiro, e, fingindo que ia às aulas, passava um pedaço das tardes, na calçada da Lagoa, sentado num banco, melancólico, vigiando a saída dos professores da Aliança. Vê-la de longe já compensaria.

Um dia, foi notado por uma garota que ia passando e que o conhecia do Liceu, onde também estudava. A garota era simpática e tinha um sorriso agradável. Conversaram e ficaram sabendo que moravam no mesmo bairro. Ao invés de tomar ônibus, decidiram ir pra casa caminhando. Marcaram pra se ver outro dia. E se viram. Um outro dia foram ao cinema, e, por sorte, não era um filme francês.

Durante a sessão, ele segurou a mão da garota e, para sua surpresa, experimentou um certo arrepio. Não deu outra: no seu próximo prazer solitário, a professora de francês cedeu lugar à garota da Lagoa.

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