quarta-feira, 6 de janeiro de 2021

CONVERSAS DE CINE ÉDEN. Como Cajazeiras e o Cine Teatro Apolo XI receberam o ator Sávio Rolim na noite de estreia do filme "O Leão do Norte"

MEMÓRIA


Cartaz original do filme protaconizado pelo artor Sávio Rolim 


por: Cleudimar Ferreira

"O Cinema sempre foi e será a maior diversão”. Era mais ou menos esse o sentido do texto gravado em jingle, que anunciava a programação dos filmes exibidos pelo Cine Éden durante a semana. O jingle era rodado todo dia na programação da Difusora Rádio Cajazeiras - a Pioneira. Se retroceder o tempo e assim podermos voltar às décadas de 60, 70, 80, veremos que uma das principais opções de lazer e entretenimento nesses decênios em Cajazeiras e todo Sertão, era mesmo o cinema.

Cajazeiras, como uma cidade cosmopolita no segmento cultural da região sertaneja, sempre teve pulsante nos seus artistas, a inquietante vontade do fazer artístico. E os seus três cinemas nesse contexto, era o complemento necessário que aguçava os sonhos e a possibilidade da realização desses. Discursão sobre os filmes considerados “filmes de artes” exibidos vez por outra no Cine Teatro Apolo XI... Debates sobre as produções do Cinema Novo e as principais jornadas cineclubistas que aconteciam no Nordeste, parecia ser a apoteótica viajem que a classe intelectual e artística desse tempo na cidade, fazia nos finais de semana, tendo como percurso as salas de cinema de rua que havia. Dois no centro e outro mais afastado, o citado Cine Teatro Apolo XI, outrora administrado pela diocese da Cajazeiras.


Mas toda essa vontade travestida de ilusão dos nossos trabalhadores das artes, se mostrava frustrada quando a notícia que chegava a cidade era a de que o ator fulano de tal, aquele ou aquela, fez um filme ou experimentou o sabor do estrelato nas telonas, seja participando como destaque ou como ponta de uma determinada produção nacional. Isso, às vezes, causava emulação em muitos, a ponto de alguns ignorarem o destaque, até por mera ciumeira. Foi o caso do ator cajazeirense Sávio Rolim. Sávio até fazer “Menino do Engenho” era uma anônima criança talentosa, então desconhecida da classe teatral, mas que se fez ator depois do filme, pelo brilhante desempenhado na fita. Mesmo assim, não foi o suficiente para ser consagrado pela classe artística ou cair na graça do público em geral de Cajazeiras.

Essa falta de empatia que Cajazeiras parecia demostrar ao trabalho de Sávio Rolim, perdurou seguidamente, mesmo o ator descolando vários trabalhos em outros filmes que fez depois de “Menino de Engenho”. Isso ficou claro na noite de estreia no Cine Teatro Apolo XI, em 1976, do filme “O Leão do Norte” - longa dirigido por Carlos del Pino em 1974-75, que Sávio Rolim participou como um dos atores de ponta no filme. Lembro muito desse dia, pois estava no cinema e presenciei a falta de acolhimento como forma de incentivo ao ator que naquele instante se encontrava na portaria do cinema.  

Nessa noite de estreia do filme, eu estava na calçada do Cine Teatro Apolo XI, em frente à portaria, esperando um sinal verde do porteiro Cícero Alves - o Cícero do Bradesco, que sempre me botava para dentro do cinema em troca de uma ajuda que eu dava a ele, na confecção das tabuletas de divulgação dos filmes, que eram colocadas nas ruas de Cajazeiras. Quando me preparava para esse instante, de repente um cara desconhecido se aproximou de mim e de outras pessoas que estavam próximas do gradil da portaria, dizendo que havia participado do filme. “Eu participei desse filme!” Foi essa a frase interpelativa que todos nós ouvimos da boca do ainda jovem ator Savio Rolim.



Se houvesse zelo da sociedade cajazeirense aos grandes feitos dos nossos artistas, que com grande esforço alcança a consagração nacional nas linguagens das artes, no mínimo, as emissoras de rádios da cidade, na época, a Difusora Rádio Cajazeiras e a Rádio Alto Piranhas - administrada também pela diocese, teriam bradado o dia todo na sua programação, chamando o público, principalmente a classe artística para ir ao Cine Teatro Apolo XI, pois naquela noite o cinema ia exibir um filme, cujo elenco constava a participação de um ator da cidade e que o mesmo, estaria presente nesse lançamento.

Contrariando o que seria natural em um caso como esse, nada foi feito de divulgação nas rádios sobre a presença do ator no cinema da diocese, no lançamento do seu filme. Não houve também mobilização da parte classe artística, para recepcionar Sávio - principalmente a classe teatral da época, que poderia ter feito uma campanha de divulgação boca-a-boca e ter distribuído panfletos, etc. Da parte do cinema, tendo a frente o bispo cinéfilo Dom Zacarias, foi pior ainda. Lembro que Zacarias mesmo estando no cinema naquela noite, nem tomou conhecimento da presença do ator do filme que seria exibido naquela noite no seu cinema.

Nessa época, o feito de se chegar aonde Sávio Rolim chegou, era fato raro. Não era tão fácil assim, pois as oportunidades que surgiam, eram preenchidas ou destinadas aos atores do eixo Rio - São Paulo. Chegar ao estrelato ou se ver na telona ou na tv, não passava de um sonho para muitos atores de outras regiões do país, principalmente do Nordeste, que adiavam ou guardavam seus sonhos se contentando com as raras participações nas produções documentais e nos curtas realizados pelo Cinema Novo. Material esse que pouco passava nos cinemas comerciais.  

Portanto, presenciei In Loco nessa noite de estreia do filme “O Leão do Norte” como se comportou o público cajazeirense e como foi à recepção na época que a cidade de Cajazeiras deu a Sávio Rolim, sua até então estrela maior no cinema nacional dos anos 70, principalmente. 

Depois da rápida conversa que tivemos e das poucas perguntas que eu e as outras pessoas fizemos ao ator, eis que se aproximou o inicio da projeção do filme e o público que já era pequeno, foi ficando menor ainda, se esvaziando. Vi quando Sávio Rolim se afastar um pouco de nós e, em um dado momento, sem companhia, sozinho na calçada do Cine Teatro Apolo XI, presenciou as ultimas pessoas que chegavam as presas e se dirigia a bilheteria e em seguida a portaria. Sem opção, o ator vendo que não havia mais nada a fazer ali naquele local, olhou para um lado e para um outro e depois saiu.. saiu em direção a Catedral Nossa Senhora da Piedade. Foi quando o porteiro Cícero Alves acenou para mim, fazendo um sinal de que eu já poderia entrar.

O Cine Teatro Apolo XI, não servia apenas para exibição de filmes
mas para outros fins. Para shows musicais, palestras, apresentações teatrais 
e festas de concluintes da área educacional da cidade. Na foto acima cerimônia de colação 
de grau da primeira turma de formandos da FAFIC no auditório do cinema.

Foto: de Netinha Quirino


DEIXE O SEU COMENTÁRIO



Nenhum comentário: